Ainda que todos os Estados brasileiros – sem exceção – reclamem dos benefícios fiscais desta ou daquela unidade federada, é certo dizer que a atual guerra fiscal nacional não comporta mocinhos nem bandidos, muito menos santos e demônios.
Em verdade, todos carregam sua partícula de culpa nesta tragicomédia tributária. É fato também que todos os Estados possuem, ou já possuíram, benefícios fiscais desrespeitando o estabelecido pela Constituição Federal. Absolutamente todos.
A hipocrisia ocorre quando um Estado reclama dos benefícios fiscais recebidos por outro, e interpõe ações de inconstitucionalidade a fim de neutralizá-los. Benefícios fiscais são fundamentais para o desenvolvimento regional, gerando o equilíbrio necessário à perpetuação de uma sociedade moderna, mas a longo prazo não comportam “leilões” fiscais entre entes coirmãos.
Um dos exemplos mais emblemáticos dos últimos tempos foi o mal-estar criado, em 1999, por conta da instalação, na Bahia, da fábrica da Ford, inclusive com anuência do governo federal.
A montadora já tinha tudo acertado com o governo gaúcho, mas desistiu do Rio Grande do Sul após a entrada do novo comando do Poder Executivo local, que não concordou com os termos do acordo e, ao receber benesses fiscais mais atraentes do executivo baiano, resolveu se instalar no Polo Industrial de Camaçari.
Após tantos anos de indiferença, parece que as coisas estão se acertando. Nas palavras do secretário da Fazenda do Maranhão e coordenador dos Estados no Confaz, Cláudio Trinchão, as unidades federadas estão convergindo para a criação de dois fundos constitucionais, com recursos previstos e garantidos.
Um deles seria usado para compensar as perdas de arrecadação e outro para estimular o desenvolvimento em regiões que não poderão mais oferecer benefícios fiscais.
Ambos poderão equilibrar os dois pratos da balança, hoje em total descontrole, pois no Brasil atualmente vigoram mais de 40 alíquotas diferentes de ICMS, variando de 4% a absurdos 30 % em alguns casos, incluindo aproximadamente 3,5 mil normas em constantes mudanças. Boa parte deste cipoal tributário decorre diretamente do objetivo de mascarar os impactos e a inconstitucionalidade de normas geradoras da guerra fiscal.
Importante lembrar que o Sistema Público de Escrituração Digital (SPED), em implantação desde 2006, viabilizará a criação de uma balança estadual, mensurando estas trocas e desaguando numa verdadeira reforma tributária.
Certamente acabaremos com absurdos tributários, como o da “mercadoria viajante”. Aquela que, importada ou produzida em um Estado, geralmente é “exportada” para outro e, em pouquíssimo espaço de tempo, reexportada de volta à origem, apenas para gerar benefícios fiscais.
Em meio a esse furacão tributário, quem vem se dando bem são os sonegadores. Chegaram a tal ponto de eficiência, que estão utilizando a tecnologia da Nota Fiscal eletrônica (NF-e) para simular a origem de produtos fabricados em São Paulo e no Rio de Janeiro, como se estes tivessem sido “importados” de Estados que cobram tributos menores.
Já está mais do que na hora de os Estados resolverem suas intransigências, pois se faz urgente uma reforma tributária, senão ideal, pelo menos a possível.
Parafraseando o famoso naturalista francês August Saint-Hilaire, tantas vezes lembrado – de Monteiro Lobato a Getulio Vargas – ao se referir às saúvas: ou o Brasil acaba com a guerra fiscal ou a guerra fiscal acaba com o Brasil.
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() Edgar Madruga é administrador de empresas e auditor pós-graduado em Informática Pericial. Especialista em SPED, é coordenador e professor do MBA em Contabilidade e Direito Tributário do Instituto de Pós-Graduação (IPOG) e mantém o blog: www.edgarmadruga.com.br.