Em fevereiro de 2013, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) editou o Parecer/PGFN/CAT/ 202, que tratou do cálculo dos lucros base para o pagamento de resultados e dividendos para sócios e acionistas. Naquela oportunidade, a posição da PGFN foi no sentido de que, “para fins de distribuição de lucros e dividendos, pelas pessoas jurídicas sujeitas ao Regime Tributário de Transição (RTT), de que trata o art. 15 da Lei nº 11.941, de 2009, são considerados isentos os lucros ou dividendos distribuídos até o montante do lucro fiscal apurado no período, ou seja, do lucro líquido apurado conforme os métodos e critérios contábeis vigentes em 31 de dezembro de 2007”. Em outras palavras, de acordo com esse entendimento, a aplicação da isenção prevista no artigo 10 da Lei 9.249/1995 somente alcançaria os lucros calculados com base nos padrões contábeis brasileiros em vigor em dezembro de 2007.
A posição adotada nesse parecer foi objeto de duras críticas, principalmente em razão de sua interpretação do artigo 16 da Lei 11.941/2009, a qual parece não encontrar fundamento da redação desse dispositivo, segundo a qual “As alterações introduzidas pela Lei nº 11.638, de 28 de dezembro de 2007, e pelos arts. 37 e 38 desta Lei que modifiquem o critério de reconhecimento de receitas, custos e despesas computadas na apuração do lucro líquido do exercício definido no art. 191 da Lei no 6.404, de 15 de dezembro de 1976, não terão efeitos para fins de apuração do lucro real da pessoa jurídica sujeita ao RTT, devendo ser considerados, para fins tributários, os métodos e critérios contábeis vigentes em 31 de dezembro de 2007” (grifos nossos).
A interpretação que nos parece correta desse dispositivo leva à conclusão de que a dita neutralidade tributária do RTT seria restrita a modificações introduzidas pela nova contabilidade que tenham efeitos sobre critérios de reconhecimento de receitas, custos e despesas computadas na apuração do lucro real. Essa leitura fica mais clara se quebrarmos o texto do artigo 16 da seguinte maneira, seguindo os destaques acima:
- as alterações introduzidas pela Lei 11.638;
- que modifiquem o critério de reconhecimento de receitas, custos e despesas computadas na apuração do lucro líquido do exercício;
- não terão efeitos para fins de apuração do lucro real da pessoa jurídica sujeita ao RTT;
- devendo ser considerados, para fins tributários, os métodos e critérios contábeis vigentes em 31 de dezembro de 2007.
Ou seja, a lei, quando faz referência à utilização, para fins fiscais, da contabilidade em vigor em dezembro de 2007, não estabelece uma regra geral. Pelo contrário, tal padrão contábil apenas deverá ser utilizado nos casos em que tenham sido afetados critérios de reconhecimento de custo, despesa ou receita com consequente impacto sobre o cálculo do lucro líquido do exercício. Nesse caso, é possível falar em uma neutralidade relativa do RTT, que parece ter sido o que foi instituído pelo artigo 16 da Lei 11.941/2009.
Mais recentemente, a Superintendência Regional da Receita Federal da 8ª Região (São Paulo) proferiu a Solução de Consulta 103/2013, na qual manifestou o entendimento de que, “na vigência do Regime Tributário de Transição, quando do cálculo da parcela a deduzir prevista no art. 9º da Lei nº 9.249, de 1995, deverão ser considerados a composição e valor do patrimônio líquido definidos segundo os métodos e critérios contábeis vigentes em 31 de dezembro de 2007. Não há que se cogitar da produção de efeitos tributários decorrentes da adoção de métodos e critérios destinados a promover a harmonização das normas contábeis brasileiras às normas internacionais, se não vigentes naquela data, inclusive no que diz respeito ao cálculo do montante dedutível a título de juros sobre capital próprio”.
Ou seja, de acordo com essa solução de consulta, o patrimônio líquido base para o cálculo de juros sobre capital próprio deveria ser determinado seguindo a contabilidade brasileira pré-adoção dos IFRS pela Lei 11.638/2007.
Mesmo após a edição do Parecer/PGFN/CAT 202/2013, havia expectativa de que entendimento diverso fosse seguido no que se refere ao pagamento de Juros sobre o Capital Próprio, já que o artigo 59 da Lei 11.941/2009 suportaria a interpretação de que o patrimônio líquido base para o cálculo dos juros seria calculado com base nos novos padrões contábeis.
Tendo em vista que se trata de solução de consulta respondida em âmbito regional, ela vincula apenas o contribuinte que a formulou. Além disso, é cedo para afirmar que esse posicionamento se consolidará dentro da Receita Federal do Brasil. Contudo, enquanto os contribuintes aguardam a uniformização da interpretação das autoridades fiscais em relação ao cálculo dos juros sobre o capital próprio e uma eventual modificação do entendimento formalizado no Parecer /PGFN/CAT 202/2013, é importante seguir monitorando a evolução do tema, que pode, no futuro, gerar controvérsias entre Fazenda e contribuintes.