A Instrução Normativa da Receita Federal 1.169 foi publicada em 30 de junho desse ano, mas seus efeitos práticos e prejuízos começam a ser sentidos agora pelas importadoras. O dispositivo, que revogou a IN 206/2002, estabelece as regras dos procedimentos aduaneiros especiais de fiscalização, aos quais as empresas estão sujeitas quando há suspeita de irregularidade em alguma operação de comércio exterior. Além da expectativa sobre como os debates da IN serão recebidos no Judiciário, o principal ponto de conflito é o prazo do controle e as formas arriscadas de pedir a liberação da mercadoria.
O procedimento especial existe desde 2002 (sem previsão legal) e analisa com maior rigor elementos da transação, como problemas específicos da origem do exportador, classificação dos produtos, condição de compra, valor da operação e histórico do importador. Para isso, o fisco tem 90 dias, prorrogáveis por mais 90. Segundo o advogado Felippe Alexandre Ramos Breda, especialista em comércio exterior do escritório Emerenciano, Baggio e Associados - Advogados, o prazo pode ser ultrapassado. Ou então, na "melhor" das hipóteses, a empresa fica com sua mercadoria parada durante todos os 180 dias.
"O prazo é sempre esgotado por conta do grande volume de trabalho. Mas as operações são sempre dinâmicas ou sazonais, relacionadas a temporadas ou obras específicas", diz. No escritório, há o caso de uma empresa de segurança que, por meio de licitação, fornecerá equipamentos para uma companhia pública. No entanto, com a mercadoria sem desembaraço, ela paga altas multas por não ter cumprido o contrato.
Outra mudança da IN 1.169 foi a extinção da liberação da mercadoria por meio de garantia, desde que não verificada fraude. "A norma trouxe o fim da garantia na esfera administrativa. Para liberar a mercadoria, só mesmo judicialmente", diz o advogado. "A tendência é cada vez mais fortalecer a fiscalização", completa.
Diante do cenário, as empresas buscam a Justiça, embora essa seja, de acordo com Breda, uma alternativa que precisa ser bastante estudada. O advogado afirma que os juízes muitas vezes afirmam que, durante o prazo do procedimento, a fiscalização exerce o seu poder dever nas atividades de comércio, ou seja, a administração está no seu direito. "É difícil a empresa provar e fazer prevalecer que ela teve prejuízo", afirma.
Além disso, a empresa tem o ônus de prestar a garantia em juízo, o que pode inviabilizar ainda mais a operação. "Além de tudo isso, há dúvida sobre qual será o desfecho do caso na Justiça", diz.
Felippe Breda afirma que o Judiciário ainda não tem posicionamento pacífico, ou seja, cada caso é um caso. "Há decisões que entendem que o procedimento especial e suas justificativas não são adequados. Outras, decidiram que a apuração deve ser mantida e o questionamento é precoce", afirma. O Judiciário tem maior sensibilidade na liberação de produtos perecíveis, medicinais, hospitalares ou para construção civil quando há interesse público.
Na busca por responsabilização, a saída em casos que não existem irregularidades seria representar, por conduta indevida e excesso de fiscalização, contra o inspetor aduaneiro. A investigação avaliaria se houve dolo ou culpa. O caso pode também ser levado ao Judiciário, com base no processo administrativo. Nessa hipótese, a União passa a ser o polo principal da ação.
Um ponto que deve gerar muitas controvérsias diz respeito à quebra de sigilo bancário. A IN anterior já previa a intimação da importadora para apresentar extrato bancário durante o controle especial. Agora, quando o documento não é apresentado, é possível que o fisco peça quebra.
A questão ainda pende de análise pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que tem diversas ações de inconstitucionalidade sobre o tema. A última decisão da Corte impediu a quebra de sigilo bancário pela Receita sem autorização judicial em procedimentos administrativos. "Essa matéria ainda pende de decisão definitiva e vinculante, que valha para todos os casos", destaca o especialista. "Os contribuintes devem ficar atentos sobre como o Judiciário vai receber esse ponto da nova instrução."
O advogado ressalta ainda que continuarão as discussões sobre se a divergência do valor aduaneiro, sem imputação de fraude, caracteriza ou não a subavaliação da base de cálculo para menor pagamento de tributos. "O Judiciário seguirá recebendo inúmeros pedidos quanto ao tema", diz.
Uma recente instrução normativa (1.181 de 17 de agosto) pegou os especialistas de surpresa e pode ser uma solução para as importadoras. Ela instituiu o procedimento de verificação de conformidade aduaneira aplicado a operador estrangeiro. Com ele, o exportador estrangeiro pode ter uma declaração de conformidade. Nas operações em que o exportador tiver essa espécie de certificação positiva, o importador não estará sujeito aos procedimentos especiais. "A legislação é complicada e coloca informações sensíveis que deverão ser mostradas ao fisco. Haverá muita discussão", diz Breda.