Com a promessa de manter a carga de impostos no País neutra, a reforma tributária, em tramitação no Senado, poderá ganhar uma regra que, na prática, aumentará a arrecadação da União no momento em que o governo federal busca mais receitas.
A proposta de emenda à Constituição (PEC) que muda o sistema de tributação de bens e serviços saiu da Câmara prevendo que as alíquotas de referência serão revistas anualmente, para evitar elevação da carga.
Agora, o relator no Senado, Eduardo Braga (MDB-AM), planeja estabelecer um cálculo para se chegar a uma média da carga de impostos dos últimos anos no País.
Uma das preocupações do senador é corrigir eventuais distorções provocadas por medidas específicas em cada ano. Exemplos são as desonerações concedidas pelo governo Jair Bolsonaro (PL) às vésperas da eleição, quando as medidas foram voltadas principalmente aos combustíveis.
Braga quer usar um cálculo que considere os cinco tributos a serem fundidos pela reforma (PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS). A opção pela média seria uma forma de mitigar o risco de flutuações. O senador tem discutido o tema com o Ministério da Fazenda e o Tribunal de Contas da União (TCU).
Considerados só os tributos da reforma, a carga representou 12,01% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2022 -o que deixaria a carga pós-reforma mais limitada caso essa fosse a referência. Em 2021, o percentual foi mais alto: de 12,85%.
A variação pode parecer pequena, mas representa diferença de R$ 14 bilhões – já feita a correção pela inflação-, o que pode gerar impacto significativo aos cofres públicos.
Os números de 2021 e 2022 estão em relatórios da Receita Federal e são os mais recentes em bases comparáveis. A carga tributária total do país foi de 33,71% do PIB em 2022 e engloba toda a arrecadação federal, de estados e municípios. Em 2021, ficou em 33,05% do PIB.
Nesse caso, cada 0,1 ponto percentual representa quase R$ 10 bilhões. Assim, a média dos últimos três anos permitiria arrecadar quase R$ 30 bilhões a mais do que a média dos últimos dez anos.
A ideia de Braga é ficar em um meio-termo para o período escolhido, que abrangeria o antes, o durante e o pós-pandemia, o que exige um período de ao menos quatro anos (2019 a 2022).
Para ele, a limitação de receitas deve demandar revisão de gastos por parte do governo, inclusive no funcionalismo, de forma a se buscar o equilíbrio nas contas públicas.
O objetivo da reforma é simplificar o sistema tributário. Ela cria dois impostos sobre Valor Agregado (IVAs): uma contribuição federal (CBS) e um imposto estadual e municipal (IBS) sobre bens e serviços. Eles resultarão da fusão de PIS, Cofins e IPI (tributos federais), além de ICMS (estadual) e ISS (municipal).
A soma das alíquotas dos dois é estimada em 25%, sendo que alguns produtos e serviços terão redução de 60% (10%, nesse caso) e outros serão isentos ou terão sistema diferenciado de recolhimento.
Quase 600 emendas já foram apresentadas à proposta, a maioria criando exceções, o que aumenta a alíquota dos dois impostos para compensar a perda de arrecadação.
Outro ponto em discussão é o benefício fiscal para montadoras se instalarem no Norte e Nordeste, defendido pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Braga quer atrelar a manutenção temporária da isenção à transição verde.
A expectativa do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), é votar o tema no plenário da Casa até dia 9 de novembro.
Com as mudanças, a PEC voltará à Câmara. Braga tem buscado alinhar as principais mudanças com o relator na Câmara, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), e o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL).
Uma das maiores alterações será no âmbito do chamado Conselho Federativo. Pelo texto aprovado pelos deputados, a ideia é arrecadar parte dos valores do IVA e distribuí-lo a estados e municípios.
Braga defende que o conselho seja algo como o Comitê Gestor do Simples Nacional, que tem função mais limitada, de regulamentar apenas determinados aspectos previstos na legislação sobre o tema.